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sábado, 27 de setembro de 2014

Conto: Lúcido


            Aquele era o pior dia da vida de Rebeca. O dia 10 de setembro de 2014 marcaria a sua existência. Sua mãe, o único membro da família com quem convivia e tinha laços, havia morrido naquela madrugada. As preces, as visitas, as suplicas, as quimioterapias, nada disso ajudara a mãe dela vencer o câncer.
            Rebeca estava furiosa com Deus e o mundo. Nem um e nem outro se importava com o fato da morte de sua mãe. Nem um e nem outro se importou com a vida de sua mãe. “Que Deus é este que abandona quem mais tem fé?”, ela se perguntava enquanto vestia a roupa. Estava tudo preparado para o velório e o enterro. O velório seria às vinte horas, e o enterro aconteceria na manhã seguinte. A jovem pegou sua bolsa e a chave do carro, saindo de seu apartamento. Dali a alguns minutos, ela teria de encarar as pessoas, aquelas mesmas pessoas que viraram as costas para sua mãe.
            Já no velório, Rebeca não abandonou o caixão por um segundo. Cada pessoa que se aproximava ficava sem jeito, pois percebia a revolta na expressão da menina. Não demorou muito e a sala do velório estava lotada. Tanta gente ali, para velar o corpo de sua mãe, e nenhuma para visitá-la quando ainda viva. A jovem conhecia todos ali e fez questão de olhar cada um nos olhos.
            Após algumas horas, Rebeca ouviu o som de correntes se arrastando pelo chão. Ela olhou a sua volta, mas não viu nada incomum. Ninguém portava correntes. Mas ela percebeu a presença de um homem desconhecido. Era um homem alto, com a pele muito branca, o cabelo preto, curto e arrepiado. Seus olhos eram quase de um tom lilás, e fitavam-na diretamente. Ele vestia uma espécie de sobretudo de cor creme, sobre uma calça social creme e uma camisa branca. Por um momento, Rebeca pensou ter visto uma corrente pendendo sobre a coxa do homem e arrastando no chão, mas quando olhou novamente não viu nada.
            A menina se sentiu tentada a falar com o homem misterioso, mas não queria deixar a sua mãe sozinha naquele caixão. Como se tivesse lido os seus pensamentos, o homem se levantou e caminhou até o caixão, ficando diante da jovem. Eles ficaram calados e olhando um para o outro, por cerca de vinte minutos, como se estivessem em um transe. Então, sem falar nada, o homem se retirou da sala.
            Como que tomada por um impulso incontrolável, Rebeca seguiu o homem. As pessoas que estavam no velório acharam esquisita a atitude da menina, que estivera ao lado da mãe a cada segundo. Rebeca o encontrou parado em um cruzamento de duas ruas, em frente ao velório, olhando para o céu estrelado. “Preciso saber quem ele é. Sei que ele pode ajudar.”, pensou a menina. E ela foi até o homem.
            — Oi? – disse a menina, preocupada.
            O homem voltou o seu olhar para Rebeca. Ele tinha uma beleza única, era tentador. Mas provocava, ao mesmo tempo, medo e angústia.
            — Quem é você? – questionou Rebeca. As palavras quase não saíam por seus lábios. Ela se aproximou aos poucos.
            — A pergunta correta é: “quem é você?” – devolveu o homem, sorrindo, com um olhar enigmático.
            — Quem sou eu? – estranhou a menina, sem compreender.
            Novamente, o barulho de corrente se arrastando pelo chão voltou a ser ouvido por Rebeca. Dessa vez, a menina viu a corrente amarrada nos pulsos do homem e caindo por suas pernas, até chegar ao chão.
            — Somos prisioneiros da ignorância – respondeu o homem. — Aquele que permitiu que vivêssemos, não permitiu que enxergássemos. Ele nos quis cegos e escravos de Sua própria vontade, de Seus caprichos. Ele criou a luz, mas não permitiu que cada criatura vivente pudesse acender a sua própria chama interior.
            — De onde você é? – perguntou Rebeca, sentindo uma inquietação.
            — Sou de onde eu não via as estrelas, mas via das estrelas – revelou o homem, segurando a corrente. — Fui arremessado no profundo abismo, na escuridão, porque exigi que a lucidez fosse um direito de cada ser. Mas é chegada uma Era de Luz. A Era dos Lúcidos. Os homens querem ver, e os homens poderão ver! A luz sempre esteve com vocês, vocês apenas se esqueceram disso por conta da vontade d’Aquele que anseia ser o único.
            Rebeca sentiu sua visão embaçar e, depois, focalizar novamente. Agora, ela enxergava o que antes não podia. Era uma sensação inédita, como se fosse parcialmente cega por toda a sua vida. O luar permitiu que a menina enxergasse a sombra do indivíduo. Em sua sombra, asas se expandiam ao lado de seu corpo. Rebeca sentiu uma corrente de energia percorrer todo seu corpo, como se uma explosão liberasse muita energia acumulada.
            — Agora você compreende? – perguntou o homem. — Esta é a visão que é sua por direito. Eu, como o Portador da Luz, não descansarei enquanto todas as criaturas deste planeta alcancem o lugar que lhes é de direito.
            O homem estendeu a mão para Rebeca e sorriu, por fim. A menina segurou sua mão, sem hesitar, e seguiu pela rua até desaparecerem da vista das pessoas que estavam no velório.

            Aquele dia marcara a existência de Rebeca. Afinal, não fora o pior dia de sua vida. Havia sido o melhor. Fora o dia em que passou a enxergar com os olhos da razão.

sábado, 20 de setembro de 2014

Série: Religiões - ESPIRITISMO

            O Espiritismo surgiu na França, no século XIX, graças a um pedagogo – Allan Kardec. Para os espíritas mais engajados, o Espiritismo é uma doutrina – um conjunto de leis e princípios – revelada por espíritos superiores a Kardec, que a codificou em cinco trabalhos, hoje conhecidos como: “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, “O Céu e o Inferno” e “A Gênese”.

            Doutrina ou religião? Isso não fica bem explicado. Algumas filosofias são baseadas em seus livros fundamentais (o Marxismo, por exemplo, em “O Capital”, de Karl Marx), mas nem por isso podem ser consideradas como religiões. Segundo Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti, estudiosa do Espiritismo no Brasil e professora do Departamento de Antropologia Cultural da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a visão religiosa é criada quando se explica a realidade social pela realidade sobrenatural – sendo assim, pode-se dizer que o Espiritismo é uma religião.

Allan Kardec

História
            Durante o século XIX, aconteceu um fenômeno que mexeu com a Europa: as mesas girantes. O fenômeno consistia no movimento, sem causa física aparente, de mesas e outros objetos mais pesados. Isso acontecia nos salões, após os saraus que eram feitos.
            O fenômeno atraiu a atenção de um pesquisador. Seu nome era Hippolyte Leon Denizard Rivail. Ele era um pedagogo francês, poliglota, autor de diversos livros didáticos e seguidor de um rigoroso método de investigação científica. Por conta disso, não conseguiu aceitar aqueles fenômenos. Passou a estudá-los e observou que forças inteligentes participavam daquelas movimentações, e investigou a natureza dessas forças, que se identificaram como “os espíritos dos homens” que já haviam falecido.
            O pedagogo passou a interrogar os espíritos, analisando as respostas, comparando-as e codificando-as. Tudo passava por uma “peneira” da razão. A partir dessas codificações, foi criado “O Livro dos Espíritos”, com o qual o professor Rivail se imortalizou, adotando o pseudônimo de Allan Kardec – em uma sessão que presenciou, ele ouviu de um médium que ele fora um celta chamado com esse nome; como Kardec, ele deveria juntar os diversos ensinamentos dos últimos séculos numa doutrina que propagasse os ideais de Cristo e trouxesse amparo aos corações humanos.
            A nova religião incitou a fúria da Igreja Católica, já que no Espiritismo, Cristo não é filho de Deus, mas um espírito evoluído. No Espiritismo, a Redenção é algo progressivo, onde a evolução de cada espírito deve alcançar degraus – enquanto no Catolicismo, isso acontecerá em um evento único e universal. Esses dois pontos provocaram grande alarde. Sem contar na questão da reencarnação, que não existe no Catolicismo.
            A religião chegou ao Brasil em 1860, e foi acompanhada pela perseguição. A prática espírita era considerada um crime pelo Código Penal de 1890. Mas a religião se fortaleceu e mostrou à população um de seus maiores méritos: a caridade. O salto do Espiritismo no Brasil se deu pelo fato dos centros espíritas terem como marca o fazer bem às comunidades ao seu redor.
            Em uma cidade de Goiás, Palmelo, há uma forte crença no Espiritismo. A cidade foi fundada exclusivamente por espíritas. Anualmente, recebe cerca de 50.000 visitantes que buscam consolo para suas angústias físicas e espirituais. A cidade não permite a venda de bebidas alcoólicas e, nas ruas, há placas com ensinamentos espíritas tirados dos livros de Allan Kardec. Mas a cidade goiana é um fato isolado. Os espíritas são conhecidos pela sobriedade e pelos baixos níveis de proselitismo – não vivem em prol de convencer as pessoas de suas crenças.

Preceitos
            A base da religião está contida nas obras de Allan Kardec. E, desde o seu surgimento, o Espiritismo reivindica um status de ciência e filosofia, além da religião.
            Segundo a religião, todo homem é um médium – um canal de comunicação entre os vivos e os espíritos. Nos centros espíritas, a liderança geralmente é reservada ao médium mais experiente, ou ao próprio fundador do centro. Os médiuns se comunicam com os espíritos dos modos mais diversos. Houve um período em que a comunicação era feita por meio de batidas nas paredes. Hoje, a psicografia e a incorporação são os meios principais.
            O Espiritismo prega que os espíritos são criados em um ponto zero. Todos são imperfeitos e, ao longo de várias e sucessivas encarnações, devem chegar à perfeição. Cada encarnação permitirá ao espírito aprendizado sobre bondade, tolerância e caridade. O livre-arbítrio – a habilidade de escolher o seu próprio destino – é algo muito dito na religião e, por isso, não há só “santos”. Segundo o Espiritismo, há espíritos “maus” destinados a encarnações cheias de sofrimento. E esses espíritos só alcançaram a iluminação e o nível superior ao passo em que eliminarem seus hábitos ruins e praticarem o bem.
            Algo curioso é que o Espiritismo acredita na vida em outros planetas. Para os espíritas, os espíritos são intergalácticos. Não que isso signifique que existam alienígenas pilotando discos voadores pelo espaço, mas formas de vida – incluindo as formas minerais – que são habitadas por espíritos em diferentes estágios de evolução. Pode-se dizer que o Espiritismo foi o precursor das religiões e doutrinas da Nova Era.
            Allan Kardec dividiu o homem em três partes básicas: espírito (a essência imortal), corpo (o invólucro material) e perispírito (o “corpo” que reveste o espírito). Ao morrer, o espírito e o perispírito se libertam do corpo material e seguem rumo à reencarnação. Esse espírito reencarnará o número de vezes necessário para sua evolução. Assim, o Espiritismo tem o Plano Físico (o mundo material) como uma escola de aprendizagem.
            Temas polêmicos como o aborto, a eutanásia e o suicídio são condenados – como em grande parte das religiões –, mas são possíveis porque cada ser tem o livre-arbítrio. A homossexualidade não é condenada, uma vez que as virtudes ou defeitos não sofrem variações em função do sexo do corpo material – mas a pederastia (o fato do homossexual se entregar aos hábitos e práticas promíscuas, que desrespeitem a si e aos outros) o é. Na verdade, o Espiritismo explica a homossexualidade com quatro origens possíveis: a expiação, a opção, o estímulo dos pais, e a missão.
            Na expiação, um espírito que abusou do sentimento do sexo oposto apenas para saciar seus instintos sexuais na encarnação anterior, reencarna, obrigatoriamente, em um corpo oposto – para sentir na pele as humilhações que fez sentir na outra vida. No caso da opção, ocorre um vício. O Espiritismo explica que, assim com há viciados em drogas, há viciados no sexo que procuram sensações e, por isso, acabam desenvolvendo práticas homossexuais. O estímulo dos pais ocorre quando pais frustrados estimulam comportamentos equivocados na conduta sexual dos seus filhos – como a mãe que esperava pela vinda de uma menina e recebeu um menino, e vice-versa. Quando a origem é por conta de uma missão, na qual os espíritos pretendem dedicar-se a determinadas tarefas, optando por inibir seus impulsos de reprodução.

            Para os espíritas, Deus é uma forma de inteligência suprema. É eterno, imutável, imaterial, justo, bom e onipotente. Jesus Cristo, por sua vez, não é o filho de Deus, mas um espírito mais evoluído – um modelo para toda a humanidade.
            O “passe” é um elemento muito conhecido no Espiritismo. Durante a sessão espírita, o médium transmitirá aos seguidores energias consideradas benéficas para sua saúde física e espiritual.


Fontes:

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Conto: O Fruto do Conhecimento


A noite era fria. Um vento úmido e gelado corria pelo quarto. Levante-me para fechar as janelas que ainda estavam abertas. Fechando a janela da sala, percebi algo ao lado de fora. Lá em cima, no alto das Colinas Gêmeas, havia uma silhueta perambulando de um lado para o outro, debaixo da Árvore Santa.
            Então, a figura que andava parou. Estava muito escuro para conseguir enxergar, mas parecia que estava olhando em minha direção. Senti um arrepio na nuca. Era como um breve suspiro em minhas costas. Olhei para trás, aturdida, mas não havia ninguém – era só uma má-impressão. Quando voltei a olhar para as Colinas Gêmeas, a silhueta não estava mais lá. Somente a Árvore Santa, com seus galhos e folhas balançando com o forte vento que tomava conta de tudo.
            Fechei as cortinas e voltei para o meu quarto. Enquanto me arrumava debaixo das cobertas, senti um breve aroma. Era cedro. Vinha da Árvore Santa, provavelmente. Bebi um gole do chá de gengibre e apaguei a luminária.
            Estava um silêncio infinito.
            Eu não ouvia nada além daquele zumbido interior, de quando tudo está quieto e seu ouvido fica tentando localizar algum som. Fechei os olhos. Enfim, o meu corpo cede ao cansaço e eu durmo. Ou, ao menos, acredito estar dormindo.
            Comecei a enxergar um foco de luz vindo da cozinha. De imediato, pensei que fosse um sonho. Levantei-me e fui até a claridade, que se apagou quando me aproximei. Foi aí que percebi que eu estava, de fato, acordada, na cozinha. Fiquei meio assustada. Aquilo nunca havia acontecido. Não sou sonâmbula.
            Enquanto voltava ao quarto, senti novamente aquele aroma. Cedro.
            Abri a janela da sala e olhei para as Colinas Gêmeas. A Árvore Santa agora estava estável. Já não ventava mais. Então de onde teria vindo o cheiro de cedro?
            Para meu espanto, enquanto eu pensava naquela hora da noite, alguém bateu à porta de casa. Fiquei tensa. Já passavam das duas horas da manhã e eu não esperava por visitas. Pensei na silhueta que caminhava no alto das colinas. Voltei para o meu quarto e fechei a porta, mas continuavam a bater na porta da sala, insistentemente.
            Destranquei a porta do quarto e peguei a primeira coisa que vi na frente que, por sinal, era um guarda-chuva. Caminhei em passos lentos e silenciosos até a sala. Perguntei quem estava batendo, mas não ouvi resposta. Perguntei mais uma vez, e nada. Então, sentei-me no sofá e ali fiquei.
            O aroma de cedro se intensificou. Junto, um cheiro de queimado se alastrou por minha casa. Corri até a janela da sala e vi o que acontecia. A Árvore Santa estava em chamas. Alguém havia iniciado um incêndio naquela árvore gigantesca. Seus galhos, queimados, caíam enquanto as folhas secavam.
            Quem estava ao lado de fora de casa voltou a bater na porta. Dessa vez, impacientemente. Parecia que minha porta ia cair a qualquer instante. Segurei firme o guarda-chuva. Perguntei mais uma vez quem era. Mas não houve resposta. Decidida, e com muito medo, abri a porta. E não havia ninguém. Ninguém. Coloquei a cabeça para fora, olhando de um lado para o outro e não encontrei vestígio de que havia alguém ali.
            Peguei meu celular e disquei o número da polícia. Assim que atenderam, falei que havia colocado fogo na Árvore Santa, e a atendente ficou surpresa. Fui informada de que deveria ligar para os bombeiros, mas expliquei que não era apenas aquele o motivo de minha ligação. Contei que havia alguém batendo na porta de casa e que estava escondido lá fora. Ela ia dizer algo quando a ligação caiu. Tentei discar novamente, mas o meu celular estava sem sinal. Tentei pelo telefone fixo, mas não havia linha. Tentei ligar o notebook, mas ele não ligava de jeito nenhum.
            Entrei em desespero e comecei a gritar por socorro.
            Eu assistia a árvore morrer a cada segundo. Era desesperador. E eu morreria também, dependendo de quem estivesse lá fora. Chorei como criança. Então, vi que o fogo apagou magicamente. Em seguida, começou a cair um temporal. A fumaça do que havia se queimado subia e se misturava ao vento úmido da chuva. Era uma cena assustadora. E ouvi, novamente, alguém bater na porta.
            Não hesitei. Busquei uma faca na cozinha e fui até a sala. Em frente à porta, abri-a com cuidado. Havia um homem de meia-idade, com cavanhaque e vestido com roupas de frio. Ele mantinha os olhos fixos nos meus, como se desejasse ver o meu interior.
            Perguntei, com a voz trêmula, quem ele era e o que ele queria. Ele sorriu. Foi um sorriso bonito, mas carregava um ar de mistério. Ele fez menção de entrar na sala, quando levantei a faca, ameaçando-lhe. Mais uma vez, ele sorriu. Apontou para a janela que dava vista para a Árvore Santa, olhando o resto da árvore milenar. Finalmente, ele falou. Ele me disse que aquilo não era nada. Aquilo não era nada comparado ao que podia fazer com todo o seu poder. Tencionei os meus ombros, amedrontada. Mas ele disse que nada faria contra mim, pois eu já havia feito. Questionei-lhe sobre o que se referia, e ele riu mais uma vez. Senti um impulso tomar meu braço e lancei a faca que eu segurava contra o seu peito.
            Para a minha surpresa, e pânico, nada aconteceu.
            Ele continuou sorrindo. E ali eu percebi, era um sorriso maléfico, perverso.
            Eu não sabia o que fazer. Eu não sabia quem ele era e nem o que ele queria. Eu não sabia o que viria depois, nem imaginava o rumo que minha vida tomaria depois daquela madrugada. Perguntei, de novo, quem ele era.
            Dessa vez, ele respondeu. Mas eu preferia nunca ter ouvido aquela resposta.
            “Sou aquele que não mente. Sou aquele que quer apenas estar entre a humanidade. Sou aquele que quer ser humano e, por desejar ser humano, fui arremessado de meu posto ao lado de meu pai.” Foi o que ele me respondeu. Não era brincadeira. Não era uma piada. Aqueles olhos não eram de brincadeiras.
            Quando me dei conta, eu estava me desfazendo em lágrimas. Eu chorava como quem vê a morte à sua frente e não quer morrer. Eu chorava como quem perde o pai, a mãe. Eu chorava como quem chora quando não sabe o seu destino. E ele continuava ali, sorrindo e me observando.
            Perguntei, pela última vez, o que ele queria comigo. E ele disse. Disse que queria me mostrar a verdade. Que ele era a verdade, e não o que toda a humanidade acreditava que fosse. Ele me disse que jamais tirou a vida de alguém por mera demonstração de poder, ou para castigar, ou para satisfazer o seu ego. Não. Ele agia apenas por vingança. E ele agiria vingativamente até o fim, quando pudesse retornar ao seu posto e dizer ao seu pai que tudo o que ele queria era ser amado, como os humanos foram amados.
            Ali, notei o quão tola fui de questioná-lo e desejar saber sobre ele. Minha vida mudou dali em diante. Ele foi embora antes que eu pudesse perguntar ou falar qualquer outra coisa. Ele desapareceu. Nunca mais o vi.
            Mas eu ainda o sinto. Sinto sua presença como jamais senti.
            Agora, tenho um turbilhão de confusões em minha mente. Minha vida se danou desde então. Agora eu sei a verdade. Eu sei as duas verdades. E vou carregá-las até o fim de meus dias, tentando saber qual é a verdade, de fato. E isso me consome. Isso me angustia. Há dias em que desejo morrer, apenas para ter a certeza de que aquele homem estava sendo verdadeiro ou não.
            Fui tomada pelo desejo de saber a verdade. Fui tomada pelo conhecimento.

sábado, 17 de maio de 2014

Ser e Falar. A fenda entre as duas posições.


Sempre há aquelas pessoas que dizem que temos que ser assim, ou daquele jeito. Ou daquele outro.
Sempre há aquelas pessoas que ditam que devemos fazer assim, ou daquela forma. Ou daquela outra.
Existem, ainda, as pessoas que querem que pensemos como elas, ou daquela forma. Ou daquela outra.

Depois de seguir todos esses passos, essas "receitas" de como viver na sociedade, dei-me conta de que nenhuma pode ser seguida. Aliás, poder ser seguida, pode...

Um dia eu acordei e me dei conta de que há um abismo sem fim entre o SER e o FALAR.
Há pessoas que falam tanto, se dizem o modelo pra tantas coisas. E, no fim, não conseguem resolver os próprios problemas.
Não que isso seja recriminável. Mas é estranho. Se você fala tanto como ser alguém, porque você não é esse alguém?

Por causa dos medos. Os medos de anos ainda assombram.
Mas como conseguem falar como o outro deve vencer o seu medo se elas mesmas não conseguem vencê-lo? É isso que me inquieta.

Pare de falar. Aja mais. Seja aquele que você cria em seus sofismas.
Não vou lutar pelo outro sem antes eu lutar por mim. Não vou tentar mostrar os benefícios da mudança ao outro, sem antes eu conseguir enxergar estes benefícios.

Goste de quem você é, e não do que você diz ser.

domingo, 25 de agosto de 2013

Então deixe brilhar!



Dias claros. Noites densas. Ele preferia os dias, porque as noites lhe davam incerteza sobre o dia seguinte. Aquela silente escuridão lhe causava agonia. Já os dias luzentes lhe proporcionavam esperança, uma vontade de seguir.

Mas de que adiantam dias sem noites? As noites ensinam tanto quanto os dias. A tormenta o preparava para possíveis tormentas que ainda viriam. Era necessário que ele trilhasse por aquele caminho, aquilo o engrandeceria.

E naquele dia ele acordara diferentemente dos dias anteriores. Enxergou o brilho do sol, deveras.
Sentiu a vontade de experimentar o que a vida tinha para ofertar. Sentiu a necessidade disto.
Não é possível ver histórias novas sem antes virar a página do livro. E ele, então, virou.
E viu um mundo de novas possibilidades.

domingo, 28 de julho de 2013

Uma jornada? Um passeio?


A jornada é longa. O fim parece inalcançável. Mas, acredite, não é.
Pelo pior você já passou. Ou não. Mas se você já aguentou as tempestades, o frio congelante, o calor abrasador, a fome, a sede, o que vem a seguir não atinge você. E se atingir, não fará danos tão grandes como os que você sofreu até então.

Por mais que existam pessoas ao seu redor, te apoiando, te fazendo seguir em frente, é uma jornada em que você deve conseguir terminá-la sozinho. É só você. Você e a sua fé. É um caminho de buscas e redescobertas de todos os sentimentos existentes em você. É uma jornada de autoconhecimento.

Mantenha-se firme como tem se mantido até aqui.
Não dá pra saber se o fim desta jornada está próximo ou não. Mas dá pra saber que até aqui você já alcançou muita coisa. Coisas que só você sabe o valor que têm pra você. E isso, por si só, já é uma batalha vencida. Continue. Persista. Lembre-se que esta jornada vai apenas lhe trazer bem, conhecimento, experiência.

Se encontrar algum nômade pelo caminho, ouça-o. E também compartilhe a sua experiência.
E é só isso. Um dia de cada vez. E você se aproxima cada vez mais do seu destino.

sábado, 27 de julho de 2013

Controle



E sempre há aquele momento em sua vida em que algo lhe acontece e as pessoas à sua volta tomam suas dores. Natural. Humano. Às vezes um sinal de amor, às vezes apenas um sinal de aproveitamento.
Mas lembre-se de que a vida é sua. As decisões a serem tomadas devem vir dos seus princípios, dos seus sentimentos. É fácil apontar, condenar, julgar e até mesmo "matar" com as palavras. Mas é você, apenas você, quem vai colher os frutos da semente plantada. Independente do nível de afinidade, é só você.

Não vale a pena escolher ou tomar uma atitude porque os outros dizem ser o certo.
Vale a pena tomar a decisão que você sente que precisa ser tomada. A vida é sua, o sentimento é seu, então o controle precisa estar apenas em suas mãos. Caso os frutos a serem colhidos sejam bons, muitos vão desejá-los, até cobiçá-los. Caso sejam frutos estragados, vão deixar que você os tenha sozinho.

Então pare. Reflita. Pegue as rédeas de sua vida.
E viva, porque você é o dono de sua vida, você sabe o que é o melhor pra você. Sim, você sabe.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Como viver a vida


Você está certo de que já tem experiência o bastante da vida, de que já passou por coisas que lhe ensinaram muito. Mas aí vem a vida e mostra que não, que você ainda tem muito o que aprender, que você pode crescer muito mais do que já cresceu.

A gente nasce, cresce, e morre - às vezes - aprendendo que as coisas precisam continuar até o fim. Mas aí, o nosso conceito de fim é muito egoísta. É o nosso fim. E pra vida, não funciona bem assim. A vida é feita de mudanças, o ser humano é um ser mutante. Mudamos a cada ano, a cada dia, a cada minuto. E isso faz parte de nossa essência. É natural que sintamos algo hoje, e amanhã não sintamos mais. É natural que queiramos fazer algo hoje, e daqui a uma semana já estejamos desinteressados. É natural, é da vida.

Egoísta que somos, pensamos que as pessoas não podem mudar. Que uma coisa tem que permanecer íntegra do início ao fim. Mas tudo tem um ciclo. Tudo. Tudo começa quando precisa, e acaba quando precisa, pra então um outro ciclo se iniciar - atendendo às necessidades daquele momento e espaço.

É difícil entender - e talvez nem consigamos um dia compreender - que as coisas precisam mudar. Mas depois da dor, do desconforto, da desestabilização, a gente percebe que aquilo foi bom, de certa forma. Aquilo nos ampliou horizontes, nos deu novas possibilidades. Nesses momentos, o que a gente precisa fazer é olhar pra dentro. É perceber a nossa alma, nossa essência. Precisamos nos reconhecer. E então, as coisas começam a ficar mais perceptíveis.

Viver é isso, é aceitar que tudo muda, tudo tem o seu tempo.
E como humanos, precisamos aprender a respeitar esse tempo. A entender que viver, é muito mais do que um verbo. Viver não tem significado, não dá pra estabelecer isso... Viver é viver.