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sábado, 14 de março de 2015

Queda: uma nova luz

O poema abaixo não segue e nem se encaixa em nenhum "padrão poético". Foi mais uma forma de contar uma história que me surgiu. Espero que gostem!



Queda

No princípio, quando só havia Deus,
o Pai Maior decidiu criar os Seus.
Antes, tinha o Universo ao seu esbanjo;
agora, dividia tudo com cada Arcanjo.

Miguel foi o primeiro;
Gabriel, o mensageiro;
Rafael, curandeiro;
Lúcifer, faroleiro.

E esta história é sobre o Iluminado;
a Estrela da Manhã, como foi nomeado.

O anjo, embora sério,
era o preferido de Deus naquele império.
Belo, alto e sagaz,
não deixava a humanidade para trás.

Egoísmo, destruição e matança:
para os homens, era uma dança.
Embora, de Deus, fosse um reflexo,
para o Pai, aquilo Lhe deixava perplexo.

Tentando ensinar uma lição,
Deus, somente, agiu com punição:
Egoísmo, destruição e matança.
era apenas Deus entrando na dança.

Achando aqueles atos tão brutais,
Lúcifer tremeu em aversão.
Ele agiu com as próprias mãos,
pois não queria, aquilo, mais.

Pediu auxílio ao Mensageiro,
mas o anjo, num devaneio,
disse-lhe que aquilo não estava previsto,
e que, sua missão, era avisar sobre o Cristo.

Apelou ao Anjo da Cura;
a resposta, com ternura,
resultou em negação.
Ele, então, tomou uma decisão.

O último apelo foi ao Principado:
— Ó, meu irmão, fique ao meu lado!
O anjo, com sua espada, então, respondeu:
— O Paraíso é meu lar; e, não mais, o teu!

Como Deus, ali, dormia,
Miguel agiu com tirania:
— Não agirás por trás do Pai!
De seu trono, o Príncipe sai.

Caindo, então, numa emboscada,
a Estrela da Manhã é atingida por uma espada;
Miguel cortou, do irmão, cada artelho,
manchando o Céu com sangue vermelho.

O Iluminado, assim, urrou de dor,
enquanto, na Terra, abria-se um abismo assustador.
Miguel procedeu sem piedade
e arremessou o irmão com crueldade.

— Teu brilho, agora, será ofuscado pelo escuro,
pois, nas entranhas da Terra, eu te enclausuro!
Enquanto caía, o anjo prometeu:
— Farei o meu reino nas trevas que me deu!
Junto a ele, outros anjos caíram:
tudo, porquê, um líder viram.

Contudo, assim que chegou ao Porão,
seu corpo sofreu uma grave alteração:
onde, antes, haviam dedos mutilados,
agora, haviam cascos afiados;
as asas, antes emplumadas,
agora estavam bem encouraçadas.

Chifres, em sua fronte, brotaram pontudos;
e os outros anjos viraram demônios cabeçudos.
Ali, em meio a toda aquela quentura,
fizeram um reino tomado por amargura.

Vivendo uma eterna impiedade,
o Diabo foi condenado à bestialidade.
Mas não viveria implorando por perdão,
pois aquela era a chance de ascensão.

Nascido Estrela da Manhã,
Lúcifer era, agora, o Satã.

sexta-feira, 14 de março de 2014

POEMA - Telefone a se calar e relógios a parar

O poema a seguir é uma tradução feita por mim do original "Stop all the clocks, cut off the telephones", escrito por W. H. Auden.



Telefone a se calar e relógios a parar,
Um apetitoso osso, dê ao cão, para ele não ladrar.
Melodias em silêncio e tambores a rufar
Trazem o caixão para o enlutado entrar.

Sob o céu, o motor do avião lastima,
Rabiscando “Ele morreu” nas nuvens acima.
Pendurem laços pretos nos pombos de rua,
E, aos guardas, luvas tão escuras quanto uma noite sem lua.

Ele foi meus quatro pontos cardeais,
Minha semana atarefada, meus descansos semanais.
Foi música, prosa, noite e dia.
Foi um erro pensar que, para sempre, o amor viveria.

Não quero mais estrelas, elas podem se apagar,
Podem pegar a lua e deixem o sol abrandar
Esvaziem os oceanos e acabem com as florestas,
Pois de agora em diante, minha vida não tem festas.


Wystan Hugh Auden nasceu em York, Inglaterra, 1907 e morreu em Viena, Áustria, em 1973 – aos sessenta e seis anos. Foi um poeta anglo-americano e considerado um dos grandes autores do século XX. Estudou na Christ Church, uma das maiores faculdades constituintes da Universidade de Oxford.
Foi o porta-voz dos jovens nos anos 1930, denunciando os males da sociedade capitalista, bem como alertando para a ascensão do totalitarismo. Alguns apontam que sua homossexualidade aparece insistentemente em sua poesia, embora tenha se casado com uma mulher, Erika Mann, para estar livre da perseguição da Alemanha Nazista.


JUSTIFICATIVAS
            A inversão no primeiro verso se deu para propiciar a formação de rimas em todo o restante da estrofe. A substituição de “pianos” por “melodias” foi pelo piano ser, justamente, o instrumento musical formador de melodias. Ao invés de utilizar o modo plural para a tradução de “mourners”, escolhi “enlutado” para a utilização do verbo “entrar”, fechando a prosódia da primeira estrofe.
            Optei em colocar “sob o céu” no primeiro verso e “nas nuvens acima” no segundo verso, para causar uma maior harmonia na entoação das rimas. Para causar uma boa rima com boas palavras no terceiro e quarto verso da segunda estrofe, optei por ocultar algumas informações traduzindo “Put crepe bows round the whit necks of the public doves” por “Pendurem laços pretos nos pombos de rua” – crepe é uma espécie de tecido ou fita preta utilizada em sinal de luto –; e adicionei informações pertinentes ao contexto do brasileiro ao traduzir “Let the traffic policemen wear black cotton gloves” por “E, aos guardas, luvas tão escuras quanto uma noite sem lua”.
            Em vez de traduzir “He was my North, my South, my East and West” literalmente, decidir colocar “Ele foi meus quatro pontos cardeais” porque engloba todo o significado do original e ainda me permitiu fazer a rima com o segundo verso da terceira estrofe. Realizar a inversão no terceiro e quarto verso da terceira estrofe me possibilitou fazer mais um jogo de rimas com as palavras “dia” e “viveria”. Avalio esta estrofe como a mais difícil a ser traduzida, por carregar muitas emoções por trás das palavras e tornar custosa a busca por rimas adequadas.
            “Podem pegar a lua e deixar o sol abrandar” foi utilizada para, primeiro, contextualizar com o primeiro verso desta última estrofe, como também para propiciar uma rima entre as duas. “Sweep up the wood” foi traduzida por “acabem com as florestas”, pois acredito que o original tenha exatamente este sentido – o Eu lírico não quer saber de mais nada agora que a pessoa que amava se foi –, além do fato de poder causar a rima com o último verso da última estrofe. “Pois de agora em diante, minha vida não tem festas” exprime com clareza o que o Eu lírico acredita, que nada poderá ser bom a partir de agora.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

POEMA - Ouvi que nada queres aprender


Ouvi que nada queres aprender,
Presumo assim que sejas abastado.
Teu futuro, nada escuro — é como um farol
A iluminar-te. Anteparo seus pais deixaram
E cairias em pedras se por isso não o fosse.
Por conseguinte, nada tens que aprender.
Persistir, tu podes, na figura que és.

Dificuldades, quando houverem —
Em algum lugar ouvi que volúvel é o tempo —
Escutarás de seus mentores
O que fazer, precisamente, para penúrias não sofreres.
Eles estudaram com outros tantos
O saber da verdade,
De como é, sempre, valiosa.
De seus preceitos para ajudar-te.

Sendo servido em demasia,
Tu nem mesmo eleva um dedo.
É certo que, se tudo fosse de outra forma,
De tudo terias que aprender.


O poema acima é uma tradução minha do original "I've heard you don't want to learn anything", de Bertolt Brecht.
Brecht nasceu e viveu na Alemanha, entre 1898 e 1956. Foi marxista - compreendendo o homem como um ser social capaz de trabalhar e desenvolver a produtividade no trabalho, progredindo e evoluindo em suas potencialidades humanas. Suas obras focavam na crítica às relações humanas dentro do sistema capitalista.

A maior dificuldade na tradução está relacionada à escolha dos tempos verbais. Muitas vezes utilizei o presente do indicativo para caracterizar uma ação que está ocorrendo no momento e enfatizar uma afirmação considerada incontestável. Escolhi, também, o presente do subjuntivo – “sejas” – por representar uma ideia hipotética. Consegui brincar com a sonoridade de “futuro” e “escuro”, fazendo um link com a metáfora do farol.Pelo poema não possuir um padrão de rimas, acredito que tenha dificultado o processo de tradução – o maior desafio –, uma vez que eu tenha ficado preocupado em como passar, então, o poema para o português de modo que se contextualizasse ao período em que o poema foi escrito.