sábado, 18 de julho de 2015

MESSOREM: O Aprendiz da Morte (C. 2)


Capítulo 2 – Cutucando as estrelas

            Enquanto jantava, à mesa, com os seus pais, Felipe não conseguia deixar de pensar no que o homem desconhecido dissera. Aquilo tudo parecia não fazer sentido algum.
            — Você está bem, filho? — perguntou Julio, o pai.
            — Sim, estou, pai — Felipe ergueu a cabeça e forçou um riso para fingir que estava bem. — Estou só preocupado com umas provas.
            — Quer ajuda? — Julio era o tipo de pai presente, que ajudava a família no que for necessário. Ver o filho naquele desânimo e naquela preocupação causava-lhe certa angústia por não saber como ajuda-lo.
            — Fica tranquilo — respondeu o menino, voltando a comer.
            Julio encarou a esposa, Marta; aquilo, definitivamente, não era tranquilo: Felipe era um menino extrovertido e muito falante, principalmente em casa.
            Marta piscou para o marido, tentando pedir-lhe que deixasse o garoto em paz.
            Assim que Felipe subiu para o seu quarto, o casal se sentou à mesa e entreolhou-se:
            — Ele, definitivamente, não está bem — concluiu Julio; a sua feição estava tensa.
            — Talvez seja a adolescência, os hormônios — sugeriu Marta, tentando ser otimista. — É normal nessa idade.
            — Não sei... — contestou Julio. — Ele estava tão bem há dois dias... Será que foi o presente que demos? Será que ele não gostou?
            — Julio, pelo amor de Deus! — Marta passou a mão sobre a nuca do esposo. — Adolescentes são assim, instáveis. Ele adorou o presente.
            Julio ainda não estava satisfeito; sabia que havia algo de mais com o filho, mas não forçaria a barra.
            No seu quarto, Felipe estava deitado e observando a rua pela janela. Não havia ninguém; nem o homem com o sedan preto. O garoto viu o ultrabook sobre a escrivaninha e pensou muito se o pegaria ou não; pegou.
            Logo que ligou o computador, o programa que estava aberto era o tal Messorem. Porém, havia uma aba diferente disponível para acesso; “Nomina”. Pesquisando o termo, Felipe descobriu que significava “nomes”. Clicou na aba imediatamente.
            Então, uma listagem com diversos nomes surgiu na tela:

            Eduardo Presto
            Luciana Pêra do Vale
            Gabriele Fontana
            Otávio Macedo
            Edivânia Costa da Silva
            José Fernandes de Abreu
            Marta Vicentini Ferraz
            Julio Vicentini Ferraz
           
            Ao ler o nome da mãe e do pai na listagem, Felipe nem se preocupou em terminar de ler os outros nomes. Ficou imaginando o que aquilo poderia significar; mas nada lhe surgiu à mente.
            Algumas daquelas pessoas, ele conhecia: eram vizinhos ou alunos da mesma escola. Mas ele não havia digitado aqueles nomes e sabia que os seus pais também não tinham a senha do computador.
            O sono bateu e Felipe decidiu dormir; fechou a tampa do ultrabook e o colocou sobre a escrivaninha. Antes de cobrir o rosto duma vez e dormir, viu de relance alguém na rua – era o homem desconhecido, mais uma vez, com o seu sedan preto. Felipe deitou e fechou os olhos, forçando-se a dormir.
            No meio da noite, Felipe acordou; puxou o celular no parapeito da janela e olhou as horas – 2h35. O menino sentiu uma imensa vontade de levantar-se da cama; e o fez. Felipe calçou um tênis preto, vestiu um jeans escuro e uma blusa preta e saiu do quarto.
            O corredor estava vazio; as luzes apagadas – os seus pais estavam dormindo. Felipe desceu até o andar debaixo e saiu da casa; embora estranhasse aquilo, o menino não parou nem por um instante; seguiu pela rua passando por quatro casas vizinhas.
            De frente a um sobrado pintado de branco, o menino encarava a janela no segundo andar; era a casa de Eduardo Presto, um colega de escola. Na verdade, Dudu (como era chamado pelas meninas da escola) era um menino arrogante que vivia humilhando os garotos nerds da escola.
            Certa vez, Eduardo havia chamado Felipe de “vara de cutucar estrelas” – é que Felipe sempre fora o mais alto e o mais magro da turma; mas isso deixou o menino muito zangado e magoado, embora nunca tivesse feito nada para se vingar.
            Por um momento, Felipe estranhou estar ali, quase às três horas da manhã, em frente à casa de Eduardo; mas a estranheza foi passageira. O garoto sentiu algo estranho – era como uma vontade crescente de encarar Eduardo e enfrenta-lo por tudo o que ele fizera com Felipe na frente de toda a escola. Assim, Felipe deu a volta na casa e percebeu que uma das janelas do segundo andar estava aberta.
            Felipe escalou o muro e debruçou-se no telhado do quintal dos fundos e, então, entrou sorrateiro pela janela do segundo andar.
            Estava tudo escuro no interior da casa; não havia som nenhum. Todos deviam estar dormindo. Foi quando Felipe se lembrou de que os pais de Eduardo viajariam naquela sexta-feira; Eduardo estava sozinho em casa.
            O menino desceu até a cozinha e procurou algo para se defender caso Eduardo acordasse; pegou um facão na primeira gaveta do gabinete (assustou-se por ter aquela ideia, mas, em seguida, relaxou). De repente, o seu celular tocou uma música – era a sua mãe telefonando; Felipe desligou o aparelho e guardou-o no bolso da calça.
            — Quem está aí? — era a voz de Eduardo. O menino devia ter ouvido o celular tocando. — Pai? Mãe? Vocês voltaram?
            Felipe correu para a sala e escondeu-se debaixo da escada; ficou observando Eduardo, que descia lentamente, preocupado.
            — Mãe? Pai? — a voz de Eduardo estava trêmula; o medo tomava conta.
            Logo que desceu o último degrau, Eduardo percebeu que havia alguém debaixo da escada e começou a gritar. Sem pensar duas vezes, Felipe segurou o facão com força e jogou-se contra Eduardo, pressionando o facão sobre o peito do garoto.
            — Seu imbecil! — Felipe segurava a boca do menino com a outra mão. — Cala essa boca! Só vim acertar as contas com você!
            Eduardo tentava falar, mas era em vão. O sangue jorrava duma ferida no seu peito e ele se afogava com o sangue que espirrava pela sua boca.
            Percebendo o que havia feito, Felipe olhou no relógio – 3h; era madrugada e ele havia feito o pior: matara alguém sem mesmo se dar conta. O garoto ficou preocupado que alguém pudesse descobrir o que fizera, mas notou que utilizava uma luva preta (a qual nem se recordava de ter vestido).
            Felipe correu para o quintal e cavou um buraco profundo bem no canto do jardim; jogou o facão ali e enterrou o objeto sob um monte de terra e de alguns arbustos. Depois disso, Felipe voltou para o interior da casa e olhou mais uma vez para o corpo que estava caído no meio da sala:
            — Você mereceu — ele soltou um breve sorriso perverso enquanto admirava o seu trabalho; um brilho avermelhado iluminou suas pupilas. — Cutuque as estrelas por mim... Dudu.
            Enquanto Felipe saía da casa e seguia rumo à sua casa, avistou um carro no final da rua – um sedan preto; era o homem misterioso. O menino, então, correu pela rua escura em direção ao carro.
            — Olá, Felipe — disse o homem misterioso, enquanto abria o vidro do carro.
            — O que nós somos? — perguntou Felipe, mais uma vez.
            — Somos discípulos da Morte — respondeu o homem; seus olhos brilhavam num vermelho vivo e transmitiam segurança. — Ceifadores. É o que nós somos... E você acaba de exercer o seu primeiro trabalho com excelência.
            — Você vai me ajudar? — questionou Felipe, olhando profundamente nos olhos do homem.
            — Com certeza — prometeu o homem, sorrindo.
            Logo que o homem concluiu a sua fala, Felipe deu a volta e entrou no carro, sentando no banco do passageiro.

            O carro deu a partida e desapareceu em meio à noite sem luar. Felipe, naquele instante, havia dado a partida naquele mistério desafiador.

2 comentários:

  1. Hahaha gostei do sorriso perverso e o sarcasmo que ele fez com Eduardo. Mas quem diria, se entregar assim tão rápido parece que ele foi possuído por algum desejo momentâneo. Achei que ele ia ter uma foice mágica, que nada é no braço mesmo hahaha. Amando a história esperando pelo próximo capítulo

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pois é! O Felipe acabou cedendo a um impulso que desconhecia até então. Mas ele ainda vai ganhar uma gadanha (veremos se ela facilitará o trabalho dele!).

      Excluir

Me dê a sua opinião, pois será importante para o meu aperfeiçoamento e para que eu possa fixar em áreas específicas da preferência do público.