Capítulo 2 – Cutucando as estrelas
Enquanto jantava, à mesa, com os
seus pais, Felipe não conseguia deixar de pensar no que o homem desconhecido
dissera. Aquilo tudo parecia não fazer sentido algum.
— Você está bem, filho? — perguntou
Julio, o pai.
— Sim, estou, pai — Felipe ergueu a
cabeça e forçou um riso para fingir que estava bem. — Estou só preocupado com
umas provas.
— Quer ajuda? — Julio era o tipo de
pai presente, que ajudava a família no que for necessário. Ver o filho naquele
desânimo e naquela preocupação causava-lhe certa angústia por não saber como
ajuda-lo.
— Fica tranquilo — respondeu o
menino, voltando a comer.
Julio encarou a esposa, Marta;
aquilo, definitivamente, não era tranquilo: Felipe era um menino extrovertido e
muito falante, principalmente em casa.
Marta piscou para o marido, tentando
pedir-lhe que deixasse o garoto em paz.
Assim que Felipe subiu para o seu
quarto, o casal se sentou à mesa e entreolhou-se:
— Ele, definitivamente, não está bem
— concluiu Julio; a sua feição estava tensa.
— Talvez seja a adolescência, os
hormônios — sugeriu Marta, tentando ser otimista. — É normal nessa idade.
— Não sei... — contestou Julio. —
Ele estava tão bem há dois dias... Será que foi o presente que demos? Será que
ele não gostou?
— Julio, pelo amor de Deus! — Marta
passou a mão sobre a nuca do esposo. — Adolescentes são assim, instáveis. Ele
adorou o presente.
Julio ainda não estava satisfeito;
sabia que havia algo de mais com o filho, mas não forçaria a barra.
No seu quarto, Felipe estava deitado
e observando a rua pela janela. Não havia ninguém; nem o homem com o sedan
preto. O garoto viu o ultrabook sobre
a escrivaninha e pensou muito se o pegaria ou não; pegou.
Logo que ligou o computador, o
programa que estava aberto era o tal Messorem.
Porém, havia uma aba diferente disponível para acesso; “Nomina”. Pesquisando o termo, Felipe descobriu que significava
“nomes”. Clicou na aba imediatamente.
Então, uma listagem com diversos
nomes surgiu na tela:
Eduardo Presto
Luciana Pêra do Vale
Gabriele Fontana
Otávio Macedo
Edivânia Costa da Silva
José Fernandes de Abreu
Marta Vicentini Ferraz
Julio Vicentini Ferraz
Ao ler o nome da mãe e do pai na
listagem, Felipe nem se preocupou em terminar de ler os outros nomes. Ficou
imaginando o que aquilo poderia significar; mas nada lhe surgiu à mente.
Algumas daquelas pessoas, ele
conhecia: eram vizinhos ou alunos da mesma escola. Mas ele não havia digitado
aqueles nomes e sabia que os seus pais também não tinham a senha do computador.
O sono bateu e Felipe decidiu
dormir; fechou a tampa do ultrabook e
o colocou sobre a escrivaninha. Antes de cobrir o rosto duma vez e dormir, viu
de relance alguém na rua – era o homem desconhecido, mais uma vez, com o seu
sedan preto. Felipe deitou e fechou os olhos, forçando-se a dormir.
No meio da noite, Felipe acordou;
puxou o celular no parapeito da janela e olhou as horas – 2h35. O menino sentiu
uma imensa vontade de levantar-se da cama; e o fez. Felipe calçou um tênis
preto, vestiu um jeans escuro e uma
blusa preta e saiu do quarto.
O corredor estava vazio; as luzes
apagadas – os seus pais estavam dormindo. Felipe desceu até o andar debaixo e
saiu da casa; embora estranhasse aquilo, o menino não parou nem por um
instante; seguiu pela rua passando por quatro casas vizinhas.
De frente a um sobrado pintado de
branco, o menino encarava a janela no segundo andar; era a casa de Eduardo
Presto, um colega de escola. Na verdade, Dudu (como era chamado pelas meninas
da escola) era um menino arrogante que vivia humilhando os garotos nerds da escola.
Certa vez, Eduardo havia chamado
Felipe de “vara de cutucar estrelas” – é que Felipe sempre fora o mais alto e o
mais magro da turma; mas isso deixou o menino muito zangado e magoado, embora
nunca tivesse feito nada para se vingar.
Por um momento, Felipe estranhou
estar ali, quase às três horas da manhã, em frente à casa de Eduardo; mas a
estranheza foi passageira. O garoto sentiu algo estranho – era como uma vontade
crescente de encarar Eduardo e enfrenta-lo por tudo o que ele fizera com Felipe
na frente de toda a escola. Assim, Felipe deu a volta na casa e percebeu que
uma das janelas do segundo andar estava aberta.
Felipe escalou o muro e debruçou-se
no telhado do quintal dos fundos e, então, entrou sorrateiro pela janela do
segundo andar.
Estava tudo escuro no interior da
casa; não havia som nenhum. Todos deviam estar dormindo. Foi quando Felipe se
lembrou de que os pais de Eduardo viajariam naquela sexta-feira; Eduardo estava
sozinho em casa.
O menino desceu até a cozinha e
procurou algo para se defender caso Eduardo acordasse; pegou um facão na
primeira gaveta do gabinete (assustou-se por ter aquela ideia, mas, em seguida,
relaxou). De repente, o seu celular tocou uma música – era a sua mãe
telefonando; Felipe desligou o aparelho e guardou-o no bolso da calça.
— Quem está aí? — era a voz de
Eduardo. O menino devia ter ouvido o celular tocando. — Pai? Mãe? Vocês
voltaram?
Felipe correu para a sala e
escondeu-se debaixo da escada; ficou observando Eduardo, que descia lentamente,
preocupado.
— Mãe? Pai? — a voz de Eduardo
estava trêmula; o medo tomava conta.
Logo que desceu o último degrau,
Eduardo percebeu que havia alguém debaixo da escada e começou a gritar. Sem
pensar duas vezes, Felipe segurou o facão com força e jogou-se contra Eduardo,
pressionando o facão sobre o peito do garoto.
— Seu imbecil! — Felipe segurava a
boca do menino com a outra mão. — Cala essa boca! Só vim acertar as contas com
você!
Eduardo tentava falar, mas era em
vão. O sangue jorrava duma ferida no seu peito e ele se afogava com o sangue
que espirrava pela sua boca.
Percebendo o que havia feito, Felipe
olhou no relógio – 3h; era madrugada e ele havia feito o pior: matara alguém
sem mesmo se dar conta. O garoto ficou preocupado que alguém pudesse descobrir
o que fizera, mas notou que utilizava uma luva preta (a qual nem se recordava
de ter vestido).
Felipe correu para o quintal e cavou
um buraco profundo bem no canto do jardim; jogou o facão ali e enterrou o
objeto sob um monte de terra e de alguns arbustos. Depois disso, Felipe voltou
para o interior da casa e olhou mais uma vez para o corpo que estava caído no
meio da sala:
— Você mereceu — ele soltou um breve
sorriso perverso enquanto admirava o seu trabalho; um brilho avermelhado
iluminou suas pupilas. — Cutuque as estrelas por mim... Dudu.
Enquanto Felipe saía da casa e
seguia rumo à sua casa, avistou um carro no final da rua – um sedan preto; era
o homem misterioso. O menino, então, correu pela rua escura em direção ao
carro.
— Olá, Felipe — disse o homem
misterioso, enquanto abria o vidro do carro.
— O que nós somos? — perguntou
Felipe, mais uma vez.
— Somos discípulos da Morte —
respondeu o homem; seus olhos brilhavam num vermelho vivo e transmitiam
segurança. — Ceifadores. É o que nós somos... E você acaba de exercer o seu
primeiro trabalho com excelência.
— Você vai me ajudar? — questionou
Felipe, olhando profundamente nos olhos do homem.
— Com certeza — prometeu o homem,
sorrindo.
Logo que o homem concluiu a sua
fala, Felipe deu a volta e entrou no carro, sentando no banco do passageiro.
O carro deu a partida e desapareceu
em meio à noite sem luar. Felipe, naquele instante, havia dado a partida
naquele mistério desafiador.
Hahaha gostei do sorriso perverso e o sarcasmo que ele fez com Eduardo. Mas quem diria, se entregar assim tão rápido parece que ele foi possuído por algum desejo momentâneo. Achei que ele ia ter uma foice mágica, que nada é no braço mesmo hahaha. Amando a história esperando pelo próximo capítulo
ResponderExcluirPois é! O Felipe acabou cedendo a um impulso que desconhecia até então. Mas ele ainda vai ganhar uma gadanha (veremos se ela facilitará o trabalho dele!).
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