Capítulo 1 – O Chamado
Felipe, um garoto de 15 anos,
residente da zona norte da cidade de São Paulo; por conta do seu aniversário, ele
acabara de ganhar um presente dos pais: um ultrabook.
O menino estava muito ansioso para
chegar em casa e começar a usar o novo computador. Assim que saiu da escola,
ele mal despediu-se dos colegas e correu para casa – que não era muito próxima,
então levou cerca de 40 minutos até chegar.
Chegando em casa, Felipe foi direto
ao seu quarto, desconectou o ultrabook da tomada e ligou o aparelho. Em dez
segundos, a área de trabalho já estava disponível; havia alguns programas
desconhecidos pelo garoto – um deles estava nomeado Messorem.
— Que estranho! — pensou Felipe,
tentando decifrar o que significava aquilo.
Numa rápida busca pela internet, o
menino descobriu que se tratava duma palavra de origem latina, que significa
“ceifadores”; isso deixou Felipe ainda mais instigado a abrir o programa de
computador.
O garoto clicou imediatamente sobre
o ícone do programa, uma espécie de foice (ele só percebeu isso após descobrir
a relação do nome com o seu significado). Enquanto o programa carregava, Felipe
mal conseguia conter a sua curiosidade.
Enfim, a janela inicial do programa
se abriu: o leiaute era todo da cor preta com alguns detalhes vermelhos e
acinzentados. A figura dum ceifador era desenhada numa sombra no fundo da
janela.
— Que bizarro! — comentou Felipe,
enquanto navegava pela janela do programa.
Uma aba com as letras piscando em
vermelho, no alto da janela, chamava a atenção do garoto com os dizeres “Nunc et in hora mortis nostrae”.
Felipe copiou a sentença e colou na página de busca da internet e, para
alimentar ainda mais a sua curiosidade, o que encontrou foi um trecho duma
oração:
— Agora e na hora de nossa morte...
— repetiu Felipe, em voz alta, enquanto lia a tradução.
— Amém! — uma voz masculina surgiu
na porta do quarto.
O menino saltou da cama assustado,
como se tivesse visto um fantasma. Mas era apenas o seu pai.
— Ah, pai... — o menino se recompôs.
— É só você!
— Só eu? — Julio fez uma careta. — Obrigado pela consideração.
— Não foi isso o que quis dizer, pai
— argumentou o garoto. — É que eu estava concentrado aqui e tomei um susto
quando você falou...
— Eu vi — concordou Julio. — Está
rezando, é?
— Não! — Felipe riu. — Estou
pesquisando umas coisas em latim, só isso.
— Entendi — Julio piscou e saiu do
quarto do filho.
Felipe se voltou para a tela do
computador: o programa havia sido fechado e, agora, só restava uma imagem de
plano de fundo a qual ele não escolhera – um ceifador de almas. O menino,
imediatamente, desligou o computador e desceu para ficar com os pais na sala.
Mais tarde, por volta das nove da
noite, Felipe foi até o portão de sua casa para olhar a rua, como sempre fazia,
mas ele percebeu algo estranho; havia um corsa sedan preto estacionado ao outro
lado da rua. O vidro do carro estava abaixado e um homem fitava o menino com um
ar misterioso – o homem tinha um rosto envelhecido e uma feição tristonha.
O menino ficou tão incomodado que
decidiu entrar para a sua casa e ir dormir.
No dia seguinte, logo que acordou,
Felipe olhou pela janela para ver se o sedan preto ainda estava ali; mas não
estava. O menino ligou o ultrabook. O
programa Messorem não abria; “Este
programa está sendo atualizado.”, a mensagem surgia sempre que ele clicava
sobre o ícone.
— Mas que droga! — reclamou.
O menino foi para o banheiro tomar
banho. Enquanto ele escovava os dentes, fixou o olhar no espelho para tentar
ver melhor algo que lhe havia intrigado: sua pupila estava dilatada, brilhando
como um rubi, e a esclera, o branco dos olhos, estava com alguns filamentos
pretos – era como se jogasse tinta preta dentro dum copo de leite.
— Que merda é essa? — ele gritou.
Felipe ficou aterrorizado e entrou
debaixo do chuveiro, esfregando os olhos freneticamente e chorando. Após isso,
voltou a olhar para o espelho e tudo estava normal.
Aquele dia seria terrível para o
menino: não conseguiu tomar o café por conta do que vira no banho, não se
concentrara nas explicações dos professores durante o período escolar, nem
conseguira voltar para casa de ônibus. A ansiedade era tanta, que o garoto
preferiu voltar para casa a pé, assim poderia espairecer.
No caminho, enquanto caminhava pela
calçada, um carro o acompanhava lentamente; era um sedan preto. Imediatamente,
Felipe apertou o passo e começou a andar depressa. Mas o carro preto também
acelerou e alcançou o menino.
Rezando e pedindo ajuda mentalmente,
Felipe ergueu lentamente o rosto e olhou para o interior do carro; mais uma
vez, aquele mesmo homem esquisito – sua feição, agora, era de urgência.
— Deixa eu falar com você? — disse o
homem de dentro do carro.
Felipe o encarou com pavor e
permaneceu em silêncio, andando o mais depressa que podia.
— Felipe, por favor! — insistiu o
homem.
Nesse instante, ao ouvir o seu nome
na boca dum desconhecido, Felipe arregalou os olhos e ficou estático na
calçada, tentando olhar nos olhos do homem desconhecido.
— Até que enfim... — disse o homem.
— Preciso muito falar com você!
— Como sabe o meu nome? Quem é você?
— interrogou Felipe. O menino encarava o homem apavorado, pois via nele a mesma
coisa que havia visto em si pela manhã: os olhos estavam tomados por um
negrume.
— Entre no carro — pediu o homem.
Ele vestia um terno preto, camisa preta e uma gravata vermelho-sangue;
adornava, em seu pescoço, uma corrente com um pingente em forma de foice.
— ‘Tá louco, né? — disse Felipe. —
Nem te conheço!
— Mas eu conheço quem você é e o que
você vai ser — revelou o homem.
O menino olhou à sua volta; não
havia absolutamente ninguém na rua além dos dois.
— Só me diga o seu nome — insistiu
Felipe.
— Não lembro mais o meu nome —
respondeu o homem. — Entre logo no carro, não farei mal a você.
— Caramba, eu sou um imbecil por
fazer isso — disse Felipe, enquanto abria a porta do sedan e sentava no banco
do passageiro.
As janelas do carro se fecharam e o
homem deu a partida; enquanto dirigia, foi bombardeado pelas perguntas do
menino, que estava bem preocupado:
— Como sabe o meu nome?
— Eu não conhecia você... — revelou.
— Até ontem.
— Você me conheceu ontem naquela
hora em que eu estava vendo a rua? — perguntou Felipe.
— Não, foi antes — respondeu o
homem. — Conheci você quando abriu aquele programa em seu computador.
— Você é um hacker? — supôs o menino.
— Não! — o homem tentou rir, mas conseguiu
uma tosse seca. — Sou o que você está prestes a ser.
— Como assim? — Felipe estava
impaciente. — Os seus olhos... Por que são assim?
— Há muito tempo atrás, quando eu
havia acabado de sair do exército, ganhei um livro em branco, uma espécie de
diário — contou o homem. — Ganhei de uma mulher que eu nunca vi antes.
O negrume nos olhos do homem parecia
estar-se movendo dum lado para o outro.
— Quando rasguei a embalagem, vi a
capa do livro: “Messorem” — lembrou o
homem.
— Ceifadores — comentou o menino,
com boquiaberto.
— Isso mesmo — confirmou o homem. —
E, depois, na contracapa, uma frase que você já deve conhecer também... Fiquei
bem assustado com isso, mas não me importei muito. Porém, quando comecei a
escrever sobre os meus dias de exército naquele diário, as coisas ficaram
estranhas.
— Estranhas? — perguntou Felipe.
— Os meus olhos; vez ou outra, eu me
via com eles assim, escuros — explicou o homem, apontando para os próprios
olhos, que estavam negros com a pupila vermelha. — Depois, encontrei este
pingente no meio do livro...
— Desculpe, mas não estou entendendo
nada — Felipe preferiu ser franco. — O que tudo isso tem a ver comigo?
— O que eu sou... — o homem resistiu
um pouco a continuar. — O que você está prestes a ser não é algo comum; não é
algo humano. Infelizmente, ninguém me ajudou a passar por isso, então sofri
muito. Mas eu estou aqui para ajuda-lo.
— O que você é? — insistiu Felipe,
curioso e preocupado.
— Desde sempre, pessoas foram
escolhidas (nunca soube por quem!) para uma função um tanto quanto
perturbadora. Essas pessoas acabam tornando-se seres não-humanos capazes de
agir como psicopompos.
— Psico-o-quê? — questionou Felipe,
sem entender uma vírgula.
— Psicompompos — repetiu o homem. —
Essas pessoas viram guias das almas que deixam os seus corpos; mostramos a
esses espíritos o caminho que eles devem seguir para que não fiquem presos aqui
na Terra.
— Mas que doideira é essa? — Felipe
encarou o homem com descrença. — Não acredito em contos de fada!
— Não é um conto de fada — disse o
homem, convicto. — É a realidade. Você está prestes a ser um Ceifador.
— Para o carro que eu quero descer!
— exigiu Felipe.
— Felipe, por favor... — implorou o
homem. — Me deixa ajudar você! Passar por isso sozinho é muito pior!
— Para o carro! — gritou Felipe.
Dois segundos depois, o carro parou.
Felipe abriu a porta e saiu sem
olhar para trás. Aquele homem não fazia parte da sua vida e jamais faria.
Aquela vida não seria a sua. Aquele destino não seria o seu.
Uouuu ficou muito boa, parabéns!!!
ResponderExcluirCurioso para saber o que esse novo destino vai trazer pro garoto
Quis entrar no carro mesmo sabendo que não devia e depois ficou com medo.... Adolescentes...
Indo ler o próximo capítulo agora mesmo 》》》
Exatamente: o temperamento dum adolescente - instável por completo! :)
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