Capítulo 5 – Sufoco
Pouco tempo depois, Felipe estava
dentro daquele cômodo com o homem desconhecido. Eles admiravam a gadanha;
Felipe estava vestindo a túnica preta.
— Você está ótimo — o homem se virou
para Felipe antes de elogiá-lo. — Mas não pode demorar muito. As tarefas
precisam ser cumpridas ao seu tempo.
— O que acontece se eu não
cumpri-las no tempo certo? — questionou Felipe, curioso.
— Não se pode ceifar a vida de
alguém fora do tempo exato — avisou o homem. — Caso contrário, você coloca tudo
a perder.
— Como assim? — o garoto não
compreendeu.
— Felipe, não interessa. Nunca
atrase uma tarefa... — suplicou o homem. — De forma alguma!
— Tudo bem — concordou Felipe. —
Tudo bem. O que faremos agora? A Luciana saiu com o namoradinho dela.
— Telefone para ela — sugeriu o
homem. — Diga que precisa muito conversar com ela. Invente alguma coisa. Ou não
invente nada.
— Posso ficar aqui? — perguntou
Felipe. — Tem algum problema se eu cumprir a tarefa aqui mesmo?
— Nenhum. Mas eu preciso ir, então —
disse o homem. — Tome cuidado com o que fará. Não deixe brechas.
Assim, o homem desconhecido foi
embora.
Felipe, em seguida, pegou o seu
celular no bolso da calça (sob a túnica) e discou o número da prima:
— Alô? — disse Felipe. — Lu? Tudo
bem?
— Oi, Fê — respondia Luciana, ao outro lado da linha. — O quê foi?
— Preciso muito falar com você —
respondeu Felipe. — Pode vir-me encontrar?
— O que aconteceu? Onde você está? — interrogou Luciana.
— Estou na Av. Nova Cantareira,
5.972 — contou Felipe. — Não dá pra enxergar o número... É um casarão que fica
a uma mansão. O muro daqui é todo pichado. Uns moleques da escola me trouxeram
pra cá e não tenho dinheiro pra ir embora.
— Meu Deus! Que longe! — Luciana ficou um pouco surpresa. — Estou indo... Vou chamar o Otávio pra ir
comigo; estou de carro.
— Não! — gritou Felipe,
imediatamente. — O Otávio, não.
— ‘Tá, Fê... Estou indo! — Luciana desligou o telefone.
Vinte minutos se passaram e o
telefone de Felipe tocou:
— Alô? Lu? — Felipe ajeitava a
túnica preta enquanto falava ao celular.
— Cheguei. Onde você está? — perguntou Luciana.
— Estou aqui dentro — respondeu
Felipe. — Machuquei a minha perna e encontrei um sofá aqui dentro. Pode vir-me
ajudar a sair?
— Ok — Luciana soltou um suspiro incomodado. — Estou indo.
Quando Luciana passou pelo muro
rebocado, ficou assustada com o estado do casarão: os escombros se espalhavam
por todo o quintal, não havia portas nem janelas – tudo estava num estado
deplorável.
— Fê? — Luciana chamava pelo primo
enquanto caminhava no corredor do quintal rumo à entrada do casarão. — Estou
entrando!
Felipe não respondeu. Ele aguardava
ansiosamente pela prima no quarto secreto; sua gadanha estava reluzente sobre a
mesa.
— Fê? — Luciana chamou outra vez.
— Aqui! — a porta do quarto
misterioso foi aberta e Luciana lançou o olhar na direção da voz.
Mas não havia ninguém na porta. A
moça decidiu entrar para ajudar o primo.
Quando entrou no quarto, a porta foi
fechada logo em seguida. Virando-se abruptamente, Luciana deu de cara com o seu
primo – vestido em trajes esquisitos e em pé ao lado da porta.
— Felipe? — a jovem estranhou. —
Isso é algum tipo de piada?
— Piada? — Felipe sorriu. Seus olhos
reluziam um vermelho vivo. — Não... Não se trata de piada, Lu. É coisa séria.
— Vai a uma festa à fantasia? —
brincou Luciana. — Para de graça e tira essa roupa!
— Não, Lu — Felipe continuou sério. —
Eu quero que você me desculpe, mas não posso prolongar isto.
— Desculpar? Por? — a jovem
continuou sem entender nada.
De repente, Felipe esticou o braço
direito e deu um safanão na cabeça da prima, que caiu desmaiada. Depois, o
menino arrastou, com dificuldade, o corpo de Luciana até o canto da sala e
amarrou os seus braços com uma corda velha.
— Mas o que é isso? — Luciana
acordou em desespero. — Felipe, o que está acontecendo aqui? Que brincadeira de
mau gosto é esta?
— Não é brincadeira, caramba! —
vociferou o menino. — Já falei. Isso é coisa séria.
— Que lugar é este? O que está
fazendo sozinho aqui? — a prima o interrogou. — Você não está machucado, né?
Foi tudo uma armação! Pra quê tudo isso? Pra quê essa roupa?
— Nossa! Que merda! — reclamou
Felipe. — Cala a boca! Eu devia ter amordaçado você.
— O que você está fazendo? Isso é
por causa do Otávio? — perguntou a jovem, deixando o medo transparecer.
— Otávio, Otávio... Chega! — pediu o
menino enquanto pegava a sua gadanha. — Será que você não consegue ficar
quieta?
— O que vai fazer com essa foice? —
Luciana ficou agoniada e começou a chorar. — Socorro!
— Cala a boca! — Felipe colocou as
mãos sobre a boca da prima. — Isto não é uma foice... É uma gadanha! E vou
mostrar o que farei com ela.
Luciana chorava; tentava gritar, mas
o som era abafado pelas mãos de Felipe. O menino impulsionava o seu corpo
contra a prima, deixando-a fraca e facilmente dominável.
Enquanto tampava a boca de Luciana
com a mão esquerda, Felipe erguia a gadanha com a sua mão direita. A lâmina
brilhava enquanto refletia a luz do sol.
Por um descuido, no momento em que
fincou a gadanha no coração de Luciana, a jovem mordeu a mão de Felipe e deu um
grito:
— Socorro! — o pedido de ajuda ecoou
por todo o imóvel de uma forma assombrosa.
— Sua vaca! — Felipe forçou a lâmina
dentro do peito de Luciana e continuou rasgando tudo por dentro.
Quando a prima já estava morta e
totalmente esfolada na região peitoral, Felipe largou a gadanha sobre a mesa e
respirou profundamente – os seus ombros subiram enquanto fez o movimento.
Felipe começou a desamarrar a prima
e a limpar a bagunça quando foi interrompido por um som vindo do interior do
casarão:
— Lu? — era uma voz feminina;
esboçava preocupação. — Cadê você? ‘Tá tudo bem aí?
— Quem é? — perguntou Felipe,
modulando a sua voz, imediatamente, para um tom mais doloroso.
— Você é o primo da Lu? — perguntou
a moça; sua voz ficava mais próxima. — Ouvi um grito dela pedindo ajuda... Você
está bem?
— Não... Está doendo muito — mentiu
Felipe. Ele queria que fosse verdade; queria sentir a dor pela perda da prima. —
Mas ela deve estar procurando algum remédio lá em cima.
— Onde você está? — a voz se
aproximava cada vez mais.
Num ímpeto, Felipe despiu-se da
túnica preta manchada de sangue e ficou vestido com a sua roupa casual, um
jeans escuro e uma camisa polo. O menino abriu a porta e saiu pelo corredor,
fechando a porta em seguida.
— Aqui — Felipe respondeu assim que
avistou uma jovem ao fim do corredor.
— Ah! — a jovem correu até chegar
perto do garoto. — O que houve? E esse sangue no seu tênis? Machucaram você?
Felipe arregalou os olhos, surpreso,
quando notou que havia respingos de sangue no seu tênis.
— Uns moleques me trouxeram pra
cá... — explicou o menino. — Mas, diz uma coisa... Quem é você?
— Sou amiga da sua prima — respondeu
a moça. — Ela pediu para eu vir junto já que você não queria o Otávio aqui. Meu
nome é Gabriele!
— Gabriele? — Felipe achou ter visto
aquele nome em algum lugar. — Acho que já ouvi a Lu falando de você... Gabriele
Fontana, certo?
— Isso! — confirmou a jovem,
sorrindo. — Vamos, eu te ajudo chegar até o carro.
— Ok — mas Felipe não iria até o
carro. Ele sabia quem era aquela menina e sabia, também, que a hora dela havia
chegado. — Só preciso buscar a minha mochila lá dentro.
— Eu vou buscar — Gabriele ofereceu
ajuda. — Espere aí.
Assim, Gabriele segue rumo à porta
pela qual Felipe havia saído segundos antes. Quando abriu a porta, a menina
ficou espantada e arremessou um olhar desamparado para Felipe.
Instintivamente, Felipe correu até o
quarto e empurrou Gabriele para dentro. A porta se fechou atrás dos dois,
deixando vazar, apenas, o som abafado dos gritos da moça.