quarta-feira, 28 de maio de 2014

Conto: O Mistério da Fênix - Parte 1


Horto Florestal, São Paulo, Brasil. Maio de 2014.

Aquele era mais um dia chato e comum.
            Ou era o que Breno pensava. Um garoto de dezessete anos, recém-formado do ensino médio e morador de uma das cidades mais populosas do planeta, São Paulo. O menino morava com os tios, pois era órfão desde os dez anos de idade, quando os pais morreram em um incêndio no prédio em que viviam.
            Desde então, sempre fora tido como um garoto problemático. Não que fosse. Os médicos sempre tentavam justificar a sua introversão como algo positivo, que talvez ele prestasse mais atenção para dentro de si do que para o mundo exterior. Mas não era isso. Breno se sentia diferente, e o era, de fato. Durante o incêndio que matara os seus pais, que se iniciou de maneira misteriosa e até hoje não revelada, o menino não se queimou, nem teve a pele lesionada. Foi algo totalmente enigmático, que a família e até mesmo os médicos atribuíram à um milagre divino.
            Com a chegada da adolescência, as coisas complicaram muito mais. Breno se viu em um mundo totalmente perverso, onde os colegas de escola zombavam dele por ser órfão, por ser tímido. Mas o maior motivo de zombaria era sua mancha de nascença no braço esquerdo. Uma perfeita pena desenhada. Nem mesmo ele entendia como algo tão perfeito pudesse ser um “defeito” da genética. O menino era conhecido como “Peninha”. Por vezes, a ira do garoto acabava causando certos acontecimentos inexplicáveis – por sorte, até então ninguém jamais presenciara tais fatos. Certa vez, enquanto usava o banheiro, um grupo de adolescentes começou a chutar a cabine onde estava até quebrar a porta, deixando-o completamente constrangido. Assim que os meninos saíram, rindo pelos corredores da escola, Breno pegou uma bituca de cigarro do chão, ainda acesa, e pressionou contra o próprio pulso, tentando fazer uma besteira. Mas, para a sua surpresa, nada aconteceu. Exatamente. A pele do menino continuou intacta. Aquilo fez Breno jogar a bituca no chão e sair correndo para a sala de aula, e ele nunca tocou no assunto com ninguém.
            Morando na casa dos tios, no bairro do Mandaqui, Breno adorava ir ao Horto Florestal. O contato com a natureza o deixava mais calmo e afastava todo e qualquer pensamento ruim. Naquele dia, havia saído bem cedo para caminhar no parque.
            Após algumas horas de caminhada dentro do parque, Breno se deitou sob algumas árvores, admirando a sua copa. De repente, ouviu um grito vindo de uma das trilha do parque. Era um grito feminino. Sem hesitar, o menino correu até a direção do grito, mas quando chegou no local, viu apenas uma jovem olhando para galhos vazios.
            — Moça? — o menino se aproximou. — Está tudo bem?
            — Oh! — a menina olhou de um modo desconfortável. — Eu... Eu pensei ter visto alguém me seguindo.
            — Ah... É que você gritou tão alto — comentei. — Acho que algum guarda vai chegar daqui a pouco.
            — Você me ouviu gritar? — a jovem o olhou com um ar de desconfiança.
            — O parque inteiro deve ter ouvido, moça... — Breno respondeu. — Mas se está tudo bem aí, sem problemas.
            — Não! — ela se aproximou.
            O rosto da moça tinha traços levemente indígenas. Seu cabelo liso e preto escorria até a metade de suas costas. Ela usava uma tiara com uma linda flor rosa, cheia de pétalas, e um vestido que a deixava confortável.
            — Não? — estranhou Breno, dando um passo para trás, com receio.
            — Não pode ir embora sem eu ao menos agradecê-lo — completou a jovem. — Obrigado pela preocupação.
            — Mas você disse que não havia ninguém aqui — lembrou o menino. —, que era só imaginação...
            — Eu sei — respondeu a jovem. — Mesmo assim, você se preocupou. Prazer! O meu nome é Régia.
            Breno estendeu a mão, copiando o gesto da moça e a cumprimentando. Ficou com vontade de coçar os seus cabelos ruivos, de tão confuso que estava.
            — Você gosta da natureza, não é? — perguntou a jovem. — Do jeito que você admira... Dá para perceber.
            — É... — gaguejou Breno. — Eu gosto. Aliás... O prazer é meu! Meu nome é Breno.
            — Breno? — Régia demonstrou certa surpresa. — Nome bonito.
            — Bem, preciso ir, Régia... — disse Breno. — Já estou fora de casa há algumas horas e meus tios devem estar preocupados.
            — Seus tios? — estranhou a moça. — Não vive com os seus pais?
            Breno se sentiu esquisito demais para começar a falar de sua vida pessoal para um estranho – por mais que o estranho fosse uma mulher linda como aquela.
            — Bem... Não — respondeu o menino. —Preciso ir.
            — Tudo bem — disse Régia, olhando Breno nos olhos. — Até a próxima!
            — Até! — disse Breno, voltando pela trilha, em direção à saída do parque.

Régia continuou ali, na trilha, observando os galhos das árvores. Eles continuavam vazios. Então, um serelepe – um esquilo com cerca de vinte centímetros de comprimento – saltou do tronco de uma árvore em direção à jovem.
            — Oi! — a moça o pegou em sua mão sem medo e sem qualquer dificuldade. — Pode avisar o Povo da Mata que encontramos o nosso líder... E diga que estou bem.
            O serelepe escutou atento às instruções da jovem, devolvendo um olhar emotivo.
            — Vá! — Régia solta o bichinho no chão. — Diga a eles que ainda temos uma chance!
            Assim, o pequeno esquilo saltou de volta na árvore e subiu com destreza, saltitando para a árvore da frente, e para outra, e outra...

Durante o caminho de volta, no ônibus, Breno ficou pensando na jovem que conhecera no parque. Ela era linda, sem dúvidas, mas muito misteriosa. Agiu de modo tão estranho quando ele a questionou o motivo de sua gritaria, como se ninguém devesse ter ouvido.
            Já em casa, em seu quarto, Breno brincava com um isqueiro. Ele não fumava, mas sempre mantinha um dentro de sua mochila – apenas para fazer a sua brincadeira preferida nos momentos de tensão. Ele acendia o isqueiro e passava a mão pela chama. E ele nunca se queimava, e não entendia a razão disso. Qualquer pessoa se queimaria, faria sérios estragos. Mas ele, não. Ele era invulnerável ao fogo, e tinha que guardar este segredo.

            Mais uma vez, o rosto de Régia surgiu na mente de Breno. Aquela menina realmente havia-o deixado intrigado. E ele mal conversara com ela. Se já não passasse das cinco da tarde, voltaria ao parque para tentar encontrar a menina e conversar mais com ela. Mas decidiu que não daria certo. Então arrumou as suas coisas e desceu para jantar com a família, como se aquele fosse mais um dia chato e comum.

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