terça-feira, 30 de setembro de 2014

Opinião: O governo de São Paulo à espera das águas de março

 Opinião | Júnior Gonçalves
30/09/2014 – 12h04

             Acerca de cinquenta dias de cessar o abastecimento de água da Grande São Paulo, segundo as estimativas de Mauro Arce, secretário estadual de Recursos Hídricos de São Paulo, o Sistema Cantareira atinge o menor nível de sua história, com 7% de sua capacidade total. Um dos maiores sistemas de captação e distribuição de água, o Sistema Cantareira é administrado pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – Sabesp – e, desde o início de 2014, conta com uma baixa considerável dos níveis dos reservatórios.
            Uma série de fatores contribuiu para o problema. A culpa recaiu, inicialmente, sobre a falta de chuva, embora esteja explícito que as chuvas recentes mal fizeram cócegas no estado atual dos reservatórios e que seria necessário, no mínimo, um mês de chuvas intensas para causar alguma modificação nessa situação.
            Depois, estudos mostraram que o desmatamento causado nas áreas florestais próximas aos sistemas e na Amazônia contribuiu para a primeira questão – as florestas possuem a importante função de reter a água da atmosfera e contribuem para a manutenção da umidade do ar. Se o ar está seco na região dos reservatórios, há o consequente aumento da evaporação na represa. Esses estudos revelam que até 70% da precipitação em São Paulo depende da água vinda da Floresta Amazônica.
            Há, também, o desperdício da água que sai dos reservatórios e segue rumo às residências e aos comércios. Cerca de 25% da água é “perdida” entre tubulações antigas e conexões clandestinas – os famosos “gatos”. Sem contar os usuários que gastam água sem pensar nas consequências, lavando as calçadas, os carros, lavando as roupas muitas vezes, tomando banhos demorados várias vezes ao dia etc.
            Não se pode deixar de citar a questão da má gestão da Sabesp. A crise atual se deve a um problema de demanda de água.  A Organização das Nações Unidas – ONU – estabelece que uma pessoa consegue se manter suficientemente com 110 litros diários para o seu consumo, alimentação e higiene. Na cidade de São Paulo, o número chega aos 140 litros diários por pessoa. Em algumas outras cidades, esse número alcança os 200 litros diários. A companhia recebeu vários alertas, durante anos, sobre relatórios que apontavam a necessidade de ampliação dos sistemas, principalmente do Sistema Cantareira.
            Em meio à crise, o governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, decretou racionamento no município de Guarulhos. Algo absurdo, já que o Sistema Cantareira ficou anos sem receber investimentos governamentais, mesmo com os vários relatórios apontando a necessidade. Mesmo avisado por técnicos e especialistas da área, Alckmin não quis impor o racionamento na cidade de São Paulo, optando pela realização de obras no Sistema Cantareira. Foi dessa forma que inaugurou as obras para captação do tão falado Volume Morto. Apesar disso, moradores e comerciantes da periferia de São Paulo já sofrem, desde meados de julho, um racionamento mascarado. O governador prefere chamar isso de “rodízio”, no qual se procura a diminuição do consumo por meio da redução da pressão da água durante a noite.
            Contudo, essa redução não é apenas uma redução, de fato. Muitos moradores das periferias não conseguem utilizar água após oito horas da noite. Não houve nem mesmo o cuidado de alertar aos moradores e comerciantes dessas regiões.
            Em ano eleitoral, é de se imaginar que Alckmin não queira deixar seu eleitorado insatisfeito. Ironicamente, pesquisas mostram que os bairros nobres da capital gastam o dobro de água que os bairros periféricos. A política de bônus na conta de água foi a ação mais “efetiva” que o governador tomou, e isso fez com que toda a população da periferia aderisse à causa. Ainda assim, os números do Sistema Cantareira continuam a cair, e o governador permanece resistente às sugestões de especialistas em aderir, de fato, ao racionamento.
            No início desta semana, o governador chegou a afirmar que o período de seca enfrentado pelo Sistema Cantareira “já passou”, e que, talvez, nem precisemos utilizar o Volume Morto.

            Planejar, quando em gestão pública, é prevenir. E foi o que Alckmin menos fez. O governador atribui a causa única e exclusivamente à falta de chuvas. Esqueceu-se de todos os avisos e alertas sobre necessidade de investimentos para que a Sabesp pudesse construir um sistema de distribuição seguro, adequado. Enxergamos, aqui, a mesma inação que a gestão de Alckmin apresenta na área da saúde, da educação, da segurança e do transporte. Falta transparência, falta sinceridade para com a população e seus próprios eleitores. Permanecer em uma posição, mesmo com tantos alertando o perigo que essa pode trazer, não é cuidar da população. Fazê-lo, é acomodar-se e garantir votos. É causar uma tempestade – apenas figurada, diante de nossa situação – em um copo d’água.

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