domingo, 25 de janeiro de 2015

Sampa: muitos parabéns e pouca água!


"Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas
Da força da grana que ergue e destrói coisas belas
Da feia fumaça que sobe, apagando as estrelas
Eu vejo surgir teus poetas de campos, espaços
Tuas oficinas de florestas, teus deuses da chuva"


Globo.com


            25 de janeiro de 2015; aniversário da cidade de São Paulo.
            A sétima cidade mais populosa do planeta completa, hoje, 461 anos de idade. Mas, infelizmente, não há motivo para que seus quase doze milhões de habitantes (segundo estimativas do IBGE em 2014) comemorem a data. Um ano atrás, o nosso Sistema de Abastecimento de Água Cantareira contava com 23,1% de sua capacidade; hoje, com a cota do volume morto, o Sistema está com 23,7% abaixo de zero. Apenas com essas informações já percebemos que não há o que comemorar (ou, ao menos, não se deveria comemorar).
            Mas hoje, enquanto visualizava a minha rede social, vi uma série de postagens alegres pelo aniversário da cidade, pelas coisas boas oferecidas pela cidade, por sua “velha-idade”; é algo quase que encantador o modo como as pessoas estão se referindo à cidade – a mesma cidade que vem passando por uma série de problemas que estão fora do controle das autoridades públicas.
            O descaso com a população vem de todos os lados: saúde (filas de espera que demoram anos, falta de equipamentos necessários, “sumiço” das verbas), transporte (“ciclovias”, trânsito, Metrô com mau funcionamento), saneamento básico, direitos básicos (água, energia), meio ambiente (frequentes quedas de árvores durante a época de chuvas), e por aí vai. Ainda assim, São Paulo ganha de seus habitantes um belo “parabéns” e inúmeros agradecimentos. Tudo bem... Você pode até dizer que a cidade não tem culpa; mas nós temos! Fomos nós quem escolhemos a autoridade que a governa, fomos nós quem escolhemos a autoridade que governa o estado, fomos nós quem escolhemos a autoridade que governa o país. Então, sim, a cidade tem culpa, porque nós somos a cidade.
            Por conta da chuva na noite da última quarta-feira, uma árvore caiu sobre a fiação da Estação Elevatória de Água João 23, responsável pelo abastecimento de Taboão da Serra, Embu, Itapecerica da Serra, Cotia e Jardim Arpoador; isso causou uma “pane” nos equipamentos, o que fez com que a distribuição da água para esses locais fosse interrompida. Porém, os moradores da região (cerca de 1,2 milhão de pessoas) ficaram prejudicados até sexta-feira, quando a distribuição de água voltou ao normal. Tudo por conta de uma árvore que caiu e demorou cerca de doze horas para ser removida.
            Estamos sem saída; não há o que fazer: quando não estamos sem água, estamos sem luz e, geralmente, estamos sem os dois serviços. A gente sabe (ou deveria saber!) que, de fato, a água vai acabar; e isso vai afetar a vida de todos os habitantes da cidade; indústrias mudarão suas localidades; shoppings, escolas e universidades, muito provavelmente, terão de fechar as portas, pois são locais que exigem muito o uso da água. Mas a gente atribui os erros ao governador (quando se atribui) e espera os milagres de Deus (ou de São Pedro); quando deveríamos ter cobrado do governador e não esperar por Deus ou milagres.
            Acredito que boa parte da população esteja comemorando o aniversário da cidade por não ter ideia da crise em que nos encontramos; a população ainda está confortável. Precisamos mudar nossos hábitos urgentemente! Com o calor que estamos enfrentando nos últimos dias, não nos preocupamos se vamos gastar mais água ou não ao correr para comprar piscinas ou tomar diversos banhos demorados no dia; o Carnaval está chegando e vai abafar, mais uma vez (vide a Copa do Mundo, ou as eleições), toda a crise pela qual estamos passando. Há países na Europa em que o uso da água não passa de sessenta litros por pessoa por dia; enquanto, aqui, no Brasil, há locais onde se registra mais de quatrocentos litros por pessoa por dia. Se continuarmos atribuindo a culpa aos governantes e não mudarmos, será tarde demais.
            Assim, povo paulistano, certifique-se de que não há o que comemorar – ao menos, não, por um bom tempo. Talvez, a nossa cidade vire uma cidade fantasma daqui a alguns anos (nada é impossível; afinal, achávamos que nunca passaríamos pela crise a qual estamos enfrentando). A festa oferecida, hoje, à população, nada mais é do que um agrado, um “cale-se porque estou-te dando um dia inteiro de lazer, cultura, água, ener...”; opa! Exceto água, água não!